Paralisações, greves e outros movimentos reivindicatórios de corporações militares era algo considerado inconcebível. Mas no mês de junho de 1997, foi deflagrado o primeiro e maior movimento de paralisação da história do país.
As paralisações de 1997
Paralisações, greves e outros movimentos reivindicatórios de
corporações militares era algo considerado inconcebível. Mas no mês de
junho de 1997, foi deflagrado o primeiro e maior movimento de
paralisação da história do país protagonizado por efetivos das Polícias
Militares e Corpos de Bombeiros Militares que reivindicavam melhorias
salariais e condições de trabalho. A crise teve início na Polícia Militar
de Minas Gerais, uma das mais conceituadas do país, pela insatisfação
em seus quadros (sargentos, cabos e soldados) com o aumento diferenciado
oferecido pelo então Governador Eduardo Azeredo (PSDB) aos Oficiais
daquela corporação. Com a morte de um Cabo da PMMG, que integrava a
paralisação, atingido por disparo de arma de fogo
em confronto com colegas de farda, o movimento recrudesceu causando um
efeito dominó que atingiu 19 estados (AC, AM, BA, CE, GO, MG, MS, MT,
PA, PE, PB, PI, RJ, RN, RS, RO, SP, SC, e SE).
As ações se caracterizaram por paralisações, passeatas e atos de
vandalismo contra viaturas e equipamentos. O Exército passou a patrulhar
as ruas no intuito de garantir a lei e a ordem em um quadro que
apresentava insegurança crescente e beirava o caos social. Com mortos,
feridos e o índice de violência avançando consideravelmente, as
paralisações começaram a desencadear efeitos negativos na opinião pública
que apoiando o movimento aguardavam que as autoridades governamentais
solucionarem a crise atendendo o pleito ou resolvendo a situação de
outra forma. As vésperas das eleições federais e estaduais (1998), e
pressionados pelos efeitos políticos negativos da greve nas campanhas eleitorais,
a maioria dos governadores iniciaram uma série de negociações com os
comandos de greve que eram apoiados pela Central Única dos Trabalhadores
– CUT a qual aventava a possibilidade da sindicalização das PMs.
Acordos foram firmados com as Associações no sentido da não
responsabilização penal e disciplinar dos grevistas e concedidos abonos e
índices de aumento salarial
aquém das expectativas, levando-se em consideração a insuficiente
dotação orçamentária dos estados. A maioria dos envolvidos retornaram a
seus ritmos normais de trabalho e algumas das PMs (AC, BA, MS, PB, PE,
RN, RS, e SP) ainda permaneceram mobilizadas aguardando o oferecimento
de vantagens financeiras maiores do que as prometidas, situação que nunca ocorreu.
A crise acabou revelando ao país de maneira mais ampla as dificuldades
socioeconômicas enfrentadas pelos profissionais deste segmento da
segurança pública ao mesmo tempo em que compeliu autoridades
governamentais a iniciativas destinadas a agilizar a tramitação e a
consequente aprovação de medidas de reestruturação e de modernização r
as políticas para o setor.
As consequências
Ao analisarmos todo o contexto que envolveu o movimento grevista de
1997 pode-se afirmar que as reivindicações da categoria pouco ou nada
avançaram além de ganhos
pontuais. As Corporações encontram-se, na atualidade, no mesmo status
de antes das paralisações de 1997. Algumas das promessas evoluíram como a
elaboração da PEC 300 (que trata de uma matriz salarial única para as
PM com base nos vencimentos e salários da PM do Distrito Federal) mas
acredito que mesmo aprovada, não deverá ser cumprida pelos Estados pela
mesma razão já alegada.
Os episódios serviram principalmente como bandeira de campanha a
partidos políticos e principalmente para na eleição de policiais
militares que comandaram os movimentos, à cargos parlamentares. Muitos, a
exemplo do Cabo Júlio César Santos, bombeiro militar de Minas Gerais
foi eleito deputado federal em 1998, reeleito em 2002 e dede 2009 é
vereador em Belo Horizonte com expressiva votação. Considerando o fato
de que em alguns estados a categoria representa de 37% a 42% do
eleitorado e, em todo o Brasil, soma um efetivo variável entre de 350 a
400 mil homens e mulheres.
Além das poucas conquistas coletivas, o movimento deixou marcas
profundas nas Instituições policiais militares resultado da quebra de
princípios essenciais da disciplina e da hierarquia, criando e
fortalecendo ressentimentos classistas que perduram até hoje.
Os movimentos de 2010 e 2011/12
Treze anos após a maior paralisação, em junho de 2010,
aproximadamente 400 bombeiros militares do Estado do Rio de Janeiro se
amotinaram invadindo o Quartel do Comando Central da Corporação,
danificando veículos, equipamentos, instalações e impedindo o
atendimento à população num movimento que reivindicava novamente
melhorias salariais e condições de trabalho. O episódio se espalhou
rapidamente pelas redes sociais e ganhou apoio de Corporações congêneres
em outros estados, de parlamentares e da população em
geral. Os grevistas foram presos por determinação da
Justiça Militar pela prática dos crimes de motim e dano ao patrimônio
público. Por meio de intensas negociações receberam “Habeas Corpus”
impetrado por um grupo de deputados federais e posteriormente a anistia
administrativa de parte da Assembleia Legislativa daquele estado. Ainda
em 2010, o Senado Federal aprovou a Lei nº 10.191, que concedia anistia
geral aos bombeiros grevistas do Rio, extensiva a oito estados (RN, BA,
RR, TO, PE, MT, CE e SC) cujos efetivos haviam participado da
paralisação de 1997 e prestado apoio na greve de 2010.
Em 29 de dezembro de 2011, a greve ocorre na Polícia Militar e
bombeiros militares do Ceará. O efetivo, reivindicando aumento salarial
e condições de trabalho, negou-se a realizar o patrulhamento ostensivo e
impediu que viaturas deixassem os quartéis sendo necessário o emprego
do Exército com apoio da Força Aérea e da Força Nacional de Segurança
Pública. Parte do comércio e das escolas fecharam suas portas por medo
da violência e a capital cearense ficou deserta em determinados
horários. A greve durou cinco dias e o governo do estado cedeu as
exigências concedendo o aumento pretendido com a promessa de anistia aos
grevistas, que retomaram a suas atividades em 04 de janeiro de 2012.
Perspectivas
Movimentos desta natureza no âmbito das Polícias Militares já se
tornaram rotina e ocorrem com desrespeito as normas constitucionais, a
legislação vigente e uma afronta aos princípios da disciplina e da
hierarquia. O atendimento parcial das reivindicações de parte dos
governos somados a anistia concedida aos comandos de greve contribui
para reforçar a importância destes movimentos e serve de exemplo para
que outras instituições procedam da mesma forma. Não há dúvidas de que
as reivindicações são por demais justas uma vez que as PM estão dentre
as poucas instituições do estado nas 24 horas do dia junto a população e
em locais em que o poder público nunca esteve presente.
Mas não é concebível que uma Instituição de natureza militar, que se
destina a cumprir e fazer cumprir as leis, possa desrespeitá-las mesmo
sob os mais nobres pretextos, igualando-se aqueles a quem combate
diuturnamente, como também não é que os vencimentos de seus
profissionais se igualem aqueles.
Neste contexto, a maior parcela de responsabilidade é dos governos que
não tratam a questão com a devida importância fomentando, mesmo que de
forma indireta, a proliferação de movimentos desta natureza. Os
problemas salariais e estruturais destas instituições permanecem
inalterados e a tendência é que as paralisações se repitam em
determinados intervalos de tempo, quando a situação ficar insustentável
novamente.
Fonte: Defesa Net
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